terça-feira, 29 de janeiro de 2008

confissão

Invejo - mas não sei se invejo - aqueles de quem se pode escrever uma biografia, ou que podem escrever a própria. Nestas impressões sem nexo, narro indiferentemente a minha autobiografia sem factos, a minha história sem vida. São as minhas Confissões e, se nelas nada digo, é que nada tenho que dizer.

Que há-de alguém confessar que valha ou que sirva? O que nos sucedeu, ou sucedeu a toda a gente ou a nós; num caso não é novidade, e no outro não é de compreender. Se escrevo o que sinto é porque assim diminuo a febre de sentir.

O que confesso não tem importância, pois nada tem importância. Faço paisagens com o que sinto. Faço férias das sensações.

Estas confissões de sentir são paciências minhas. Não as interpreto, como quem usasse cartas para saber o destino. Não as ausculto, porque nas paciências as cartas não têm propriamente valia.

De resto, com que posso contar comigo? Uma acuidade horrível das sensações e a compreensão profunda de estar sentindo...

Uma inteligência aguda para me destruir e um poder de sonho sôfrego de me enterter... Uma vontade morta e uma reflexão que a embala...

(...)assim é toda a vida. Um tédio que inclui a antecipação de mais tédio; a pena, já, de amanhã ter pena de ter tido pena hoje - grandes emaranhamentos sem utilidade nem verdade... Em nada me pesa ou em mim dura o escrúpulo da hora presente. Tenho fome da extensão do tempo e quero ser eu, sem condições.

Passo tempos, passo silêncios...


Fernando Pessoa in Livro do Desassossego

falar...para quê? pensar...SEMPRE!!!

Alguém tinha o mau hábito de se exprimir, de quando em quando, com toda a franqueza acerca dos motivos pelos quais agia e que eram tão bons ou tão maus como os motivos de todas as pessoas. Primeiro, causou escândalo, depois suspeita, pouco a pouco foi terminantemente proscrito e banido da sociedade, até que, por fim, a justiça se recordou de um ser tão abjecto em ocasiões, em que ela não costumava ter olhos ou os fechava. A falta de mutismo quanto ao segredo geral e a irresponsável propensão para ver o que ninguém quer ver - a si próprio - levaram-no à prisão e a uma morte prematura
(Friedrich Nietzsche, in humano, demasiado humano).

tolerancia = superioridade?!

A palavra tolerância, provém da palavra Tolerare que significa etimologicamente sofrer ou suportar pacientemente. O conceito tolerância radica numa aceitação assimétrica de poder:
a) Tolera-se aquilo que se apresenta como distinto da maneira de agir, pensar e sentir de quem tolera;
b) Quem tolera está, em princípio numa posição de superioridade em relação aquele que é tolerado. Neste sentido pode ou não tolerar.

A tolerância pressupõe sempre um padrão de referência, as margens de tolerância e aquilo que se assume como intolerável.

A tolerância pode surgir como a simples aceitação das diferenças entre aquele que tolera e o tolerado, ou como a disponibilidade do primeiro para integrar ou assimilar o segundo.

coisas que eu sei



Eu quero ficar perto de tudo que acho certo
Até o dia em que eu mudar de opinião
A minha experiência, meu pacto com a ciência
O meu conhecimento é minha distração

Coisas que eu sei
Eu adivinho sem ninguém ter me contado
Coisas que eu sei
O meu rádio relógio mostra o tempo errado
Aperte o Play

Eu gosto do meu quarto, do meu desarrumado
Ninguém sabe mexer na minha confusão
É o meu ponto de vista, não aceito turistas
Meu mundo tá fechado pra visitação

Coisas que eu sei
O medo mora perto das idéias loucas
Coisas que eu sei
Se eu for eu vou assim não vou trocar de roupa
É minha lei

Eu corto os meus dobrados
Acerto os meus pecados
Ninguém pergunta mais, depois que eu já paguei
Eu vejo o filme em pausas
Eu imagino casas
Depois eu já nem lembro do que eu desenhei

Coisas que eu sei
Não guardo mais agendas no meu celular
Coisas que eu sei
Eu compro aparelhos que eu não sei usar
Eu já comprei

As vezes dá preguiça
Na areia movediça
Quanto mais eu mexo mais afundo em mim
Eu moro num cenário
Do lado imaginário
Eu entro e saio sempre quando tô a fim

Coisas que eu sei
As noites ficam claras no raiar do dia
Coisas que eu sei
São coisas que antes eu somente não sabia

Coisas que eu sei
As noites ficam claras no raiar do dia
Coisas que eu sei
São coisas que antes eu somente não sabia

Agora eu sei